sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Personagens importantes
João Fuzeto Filho, 64 anos, Guarda Civil Municipal de São Caetano do Sul (GCM)
Por: Priscila Gorzoni






As histórias inusitadas de Seu Fuzeto

Não são poucas as histórias que João Fuzeto Filho, 64 anos, Guarda Civil Municipal de São Caetano do Sul (GCM) há 26 anos coleciona em sua função de guarda.
Desde a infância a vida de Seu Fuzeto, como se tornou conhecido em toda a cidade, é só aventura. “Quando eu era criança o meu pai vivia querendo me bater, porque eu era muito rebelde. Sempre aprontei”, conta.
Durante a infância Fuzeto teve uma vida simples na cidade de Martinópolis, no interior de São Paulo onde nasceu com os pais João Fuzeto e Jandira Pereira e os quatro irmãos. No interior sua vida era trabalhar na roça, tratar dos animais, amansar os cavalos e brincar com os animais. Os pais criavam animais e plantavam para a sobrevivência da família. Tudo o que precisavam tiravam do quintal.
Com o tempo e as dificuldades financeiras seus pais resolveram tentar a vida na cidade, e em 1975 mudaram-se para São Paulo.
A família Fuzeto mudou-se para a Vila Ema, em São Paulo. “Moramos com um irmão que já estava aqui”, explica.
Em São Paulo Fuzeto conheceu a mineira Malvina Santos Fuzeto, com quem se casou, vive até hoje e com quem teve um filho chamado Ricardo.
Assim que chegou a São Paulo, Fuzeto começou a trabalhar em uma fábrica na Vila Ema. Na empresa passou por várias funções, entre elas a de operador de máquina, que não conseguiu ficar por muito tempo porque suas pernas doíam. “Fui ao médico que me disse se não mudasse de profissão, não me aposentaria”, relata.
Nessa época, com o objetivo de mudar de profissão começou a fazer curso de tiro e trabalhou durante oito meses como vigilante particular. Foi com essa experiência que conseguiu ingressar na guarda municipal. Na época ele tinha 34 anos, e para a sorte de Fuzeto a concorrência ao emprego era bem menor. O guarda procurou o tenente Silvino Fiori, responsável pelo setor. “Era uma época boa para trabalhar na guarda, porque não tinha muita gente e entraram comigo apenas mais sete candidatos. Atualmente deles só restaram eu e o Zequias”, relata.
Fuzeto relata que a postura do público era bem distinta da atual. As pessoas respeitavam mais os guardas, não existiam tantas leis e reclamações contra a categoria. “Nós éramos mais respeitados e obedecidos. Muitas vezes eu fiz vigílias em pontos da cidade sozinho e nunca me aconteceu nada. Hoje qualquer coisa as pessoas reclamam para o comando e somos corrigidos”, relata.
Para conseguir uma vaga na Guarda Civil Municipal Fuzeto tinha algumas vantagens sobre os outros candidatos, havia trabalhado e feito curso como vigilante particular. Nele o guarda aprendeu várias coisas entre elas a de manusear armas. Mas como não tinha habilitação precisou tirar, pois o vigilante tinha que saber dirigir.
Para conseguir o emprego o guarda foi até um posto da guarda que ficava no terminal rodoviário e falou com o policial. Depois que contou um pouco da sua vida e da necessidade de trabalhar na guarda, o policial fez uma carta para ele de recomendação. “Indicou-me levá-la ao setor da Guarda Municipal que ficava na prefeitura e então eu entreguei a cartinha para o professor José Gato, que na época era o responsável. Ele conversou comigo e disse que por ele, eu já estava aprovado, mas me pediu para voltar para uma entrevista. Eu então voltei no dia marcado, fiz testes e como sabia atirar me sai bem em tudo. Disse que gostava de trabalhar a noite, porque ninguém queria, então achei que teria mais chances. Como eu precisava de dinheiro nenhuma dificuldade que ele me apresentasse me assustava”, relata.
Com o objetivo de comprovar a vontade de Fuzeto para o trabalho o mandaram para fazer a vigilância do Clube Santa Maria. “Antes fizeram vários testes e em um deles me perguntaram se fizessem um barulho à 1 hora da manhã no Clube Santa Maria o que eu faria. Todos os guardas responderam que acenderiam a luz, mas falei que não porque se fizesse isso o ladrão me veria e atiraria em mim. O coordenador gostou da minha resposta e então me colocou para guardar o Clube Santa Maria”, conta.

Dos vândalos do Clube Santa Maria ao nascimento em um carro no Pronto socorro

O Clube Santa Maria era considerado um dos piores locais para os vigilantes cuidarem, porque diziam que lá tinham um grupo que entrava de madrugada e jogava os guardas dentro da piscina.
Mas Fuzeto precisava muito do trabalho então não vacilou e aceitou o desafio. Como ele tinha experiência com armas nada podia ameaçá-lo. “Em uma noite no Clube vieram 15 homens e tentaram me jogar na piscina, só que não conseguiram porque eu dei uns tiros e eles correram de medo. Nessa época eu era bem jovem, tinha 36 anos e fiquei durante alguns anos como guarda do Clube. Mais tarde entrou no comando o Clóvis e então me mandaram para a rua, me colocaram para fazer a guarda na rodoviária e no Pronto Socorro da Rua. Vital Brasil”, relata.
As histórias mais inusitadas Fuzeto viveu em seu segundo posto de vigilância, o Pronto Socorro da Vital Brasil. No local ele aprendeu muitas coisas, entre elas até a socorrer as pessoas. “Eu chegava às 5 horas da manhã no trabalho, em uma escuridão que só Deus e naquela época era só eu cuidando de todo o local. Então aconteceram muitas coisas comigo lá. Algumas me marcaram”, lembra.
A mais marcante aconteceu com um rapaz que estava internado no Pronto Socorro por problemas psiquiátricos. Ele estava no saguão aguardando o médico para atendê-lo, só que ao invés de ficar sentado, deixaram-no aguardar lá fora. “Quando de repente eu escutei uma gritaria e então me chamaram. Quando entrei vi que ele havia se atirado lá de cima da rampa de cabeça. Ele abriu a cabeça e quando caiu estava cheio de gente, todo mundo olhando e os miolos dele espalhados pelo chão, muito sangue. Ninguém tinha coragem de pegar o rapaz. E o pior era que a maca não descia onde estava o corpo e eu então tive que pegá-lo no colo, levá-lo até a maca, subir a rampa para o médico passar a faixa na cabeça dele. Mas assim que terminou de passar a faixa ele deu um último suspiro e morreu”, relembra.
Outro caso que marcou Fuzeto foi o do nascimento de um bebê dentro do carro. “Era de madrugada quando um homem chegou dirigindo um carro antigo e passou na frente do pronto socorro. Saiu gritando que a cunhada dele estava tendo um bebê e onde estava o médico. Eu expliquei que os médicos estavam lá dentro e que ele precisava descer a mulher do carro para colocarmos na maca. Quando abri a porta do carro a mulher já estava ´ganhando`(sic) a criança. O menino nasceu ali, dentro do carro e eu fiquei muito emocionado, foi chocante”, relata.  
O guarda conta que aprendeu muita coisa no Pronto Socorro, vendo as enfermeiras desempenhando as suas atividades e as defendendo dos ataques dos pacientes com problemas mentais. Não era fácil, mas ali foi uma escola para ele.

Um estanho no terminal rodoviário e o caso da garça do parque ecológico

Mais tarde Fuzeto foi trabalhar no terminal rodoviário da cidade e também passou alguns momentos delicados. “Lá eu ficava a madrugada inteira sozinho fazendo a vigilância. Eu fazia ronda na parte de baixo e na de cima. A lanchonete ficava aberta até á 1 hora da madrugada. Eu conhecia todos os motoristas e um dia um dos ônibus chegou ao ponto final e um senhor de capa desceu, mas tinha um rapaz lá dentro que não queria descer. Eu então o fiz sair à força, ela estava drogado e saiu correndo. Mas o senhor de capa estava armado, logo percebi e tive receio, pois não sabia que era um policial à paisana. Até eu descobrir passei muito medo dele ser um bandido e estar com o rapaz”, explica.
Naquela época a Guarda Municipal não tinha rádio e nem viatura para dar apoio aos guardas, por isso os policiais tinham que resolver os problemas sozinhos.
Fuzeto trabalhou em outros locais como a Cidade das Crianças e o parque ecológico. No primeiro teve até que fazer um salvamento e graças a ele o homem sobreviveu.
Ele estava fazendo a ronda quando de repente viu uma viatura parar e correr para uma das casinhas que ficava dentro da Cidade das Crianças. “Eles tentavam socorrer um funcionário que tinha a pressão alta e havia comido demais e isso lhe fez mal. Ele então engasgou, caiu de bruços e quando eu cheguei lá e o vi assim com a minha experiência de Pronto Socorro o levantei e fiz massagens na barriga dele. Ele então soltou a carne que estava entalada na garganta e sobreviveu”, relata.
No parque ecológico a história mais engraçada de Fuzeto envolve o salvamento de uma garça. “Uma vez uma garça fugiu do parque e foi parar no cemitério das Estadas das Lágrimas, que fica ao lado. Ela era grande e corria muito, era muito difícil pegá-la e só tinha eu para fazer isso. Corri no cemitério atrás dela até que consegui pegá-la com cuidado e levá-la de volta para o parque”, diz.
Fuzeto conta que sua vida daria um livro e eu não tenho dúvidas disso.  Mas antes de escrevê-lo, o guarda deseja se aposentar e voltar para a roça, para as suas raízes.



 *É jornalista, pesquisadora, historiadora. Formada em jornalismo pela Universidade Metodista, com formação em ciências sociais pela USP e Direito pelo Mackenzie, tem especialização em Fundamentos e Artes pelo Instituto de Artes da UNESP de São Paulo e Mestre em história pela PUC de São Paulo. É autora de 11 livros, entre eles Abre as portas para os Santos Reis da Editora Fundação Pró-Memória, Animais nas Batalhas pela editora Matrix e Os benzedores que benzem com as mãos da editora UCG. 

Fonte: Texto publicado na Revista Raízes 54




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