O misterioso curandeiro Vicente.
O cemitério São Caetano não é só
famoso por ser o primeiro cemitério da cidade inaugurado em 1911, mas por ter
entre os seus falecidos uma das figuras mais enigmáticas da história, Vicente O
curandeiro.
Esse
famoso ilustre era tão conhecido que ainda hoje recebe romarias de doentes que
vem em busca de milagres e graças.
Ele
se chamava Vicente o curandeiro e teve esse nome por ter sido um dos maiores
benzedores da região.
Vicente tinha
uma fama que rompia distâncias, dificuldades, crenças e o seu túmulo, ainda
hoje é um dos mais visitados do Cemitério São Caetano.
Demoro
um pouco para encontrar o túmulo de Vicente. O Cemitério São Caetano, embora
pequeno é repleto de túmulos suntuosos e capelas esculturais. O túmulo de
Vicente é baixo, simples, tímido. Ele está na parte de cima do Cemitério São
Caetano, meio esquecido, sujo das folhas das árvores e do pó do tempo. No meio
de sua aparência de abandonado vejo a foto do curandeiro.
Quando olho na
foto do túmulo de Vicente vejo um homem de chapéu, barbas longas, olhar
penetrante e semblante misterioso. Imagino a reação das pessoas ao se depararem
com um homem assim.
Contam
que Vicente tinha um estilo peculiar de benzer. Ele recebia os doentes na porta
de casa com um caderno nas mãos onde anotava os nomes das pessoas e em frente a
eles marcava uma cruz. Depois que fazia isso, Vicente ou como era conhecido pai
Vicente, dizia ao visitante que iria colocar seu nome nas luzes. Em seguida
pedia que o visitante voltasse daqui a alguns dias.
Vicente
não cobrava nada por suas curas, somente ouvia as pessoas. Quando acabava as
rezas preferia que lhe falassem: “Deus lhe pague” e sempre respondia: “Amén nós
tudo”.
Também
não gostava que fizessem brincadeiras com os seus benzimentos. Um dia veio a
sua capela dos rapazes do Ipiranga. Um deles esfregou as mãos na boca dizendo
que sentia dor de dente. Vicente logo percebeu ser mentira e disse: “Você veio
me debochar. Então vai ficar com dor de dente mesmo”. Não deu outra,
imediatamente o rapaz jogou-se no chão sentindo dores terríveis de dente.
A
segunda-feira era o dia de maior movimento, porque Vicente não atendia aos
domingos. Antes de atender os visitantes, Vicente distribuía fichas a atendia
rapidamente a cada um, colocando a mão no ombro das pessoas e indicando que
passassem adiante.
Outra
curiosidade de Vicente era atender ao público com a mão direita para cima.
Perguntava o nome da pessoa e dizia as perturbações espirituais e as moléstias
dos indivíduos. Por fim recomendava novena.
Vicente morava
no bairro Santa Maria e faleceu em 1925. Por causa dele se criou uma estrada,
onde milhares de pessoas passavam, só para conseguir uma cura.
Enquanto olho
a foto do barbudo Vicente fico imaginando como seria receber seus benzimentos.
Tenho uma base deles em relatos escritos por Admir Medici em seu livro Migração
e Urbanização. Medici conta um dos casos, o de Caetana Palmiro, que em 1920,
com 2 anos de idade não conseguia andar. Assim seus pais resolveram levá-la ao
pai Vicente. O curandeiro então tirou das mãos um anel de pedra preta e passou
em Caetana. Depois ordenou que a criança fosse levada ao pátio de sua casa,
onde ela começou a andar.
O curandeiro
Vicente não era nascido em São Caetano, ele viera com a sua família de Santo
Amaro entre 1906 e 1909.
Ele era casado
com Maria Joaquina de Jesus Vaz Rodrigues Vieira, que na data do falecimento do
marido, em 1925, tinha 44 anos. O curandeiro faleceu em março de 1925.
Mas os
romeiros que vinham de longe tinham que ter paciência, pois chegar à casa de
Vicente não era tarefa fácil, o casarão do benzedor estava localizado na parte
alta do bairro da saúde (atual santa Maria).
Os romeiros
desembarcavam na estação ferroviária, caminhavam até o centro e entravam na Rua
João Pessoa, conhecida na época como Virgilio Rezende. Os romeiros então
ganhavam a Rua. Goiás, que era conhecida na época como Formicida, atingia a
Alameda São Caetano e no final da Rua. Cassaquera, onde atualmente é a Praça
Francisco Pires, fica a capela de Vicente.
O ponto exato
da casa em que o curandeiro Vicente atendia localizava-se hoje, entre a Alameda
Cassaquera, rua. Arary, rua. Guarda-Mor Greenhargh e rua. Lomas Valentina.
A
casa de Vicente era uma fazenda, que tinha uma capela particular junto ao
terreiro toda decorada em tons dourados, pintada com figuras de anjos e santos.
Os que
chegavam eram recebidos por Vicente o curandeiro em sua capela particular. No
altar de sua casa de orações existia um Cristo Crucificado e a imagem de São
Pedro, cujo aniversário, no dia 29 de julho era comemorado com festa.
Quando
Vicente morreu, seu corpo foi levado para a Matriz. Já na porta, o padre Pelanda
postou-se na porta e disse: “-Aqui ele não entra”. E não entrou. Porém a
população que gostava muito de Vicente, não deixou Pelanda durar muito na
cidade.
Fonte: O livro das curiosidades de São Caetano do Sul, Priscila Gorzoni
Fonte: O livro das curiosidades de São Caetano do Sul, Priscila Gorzoni
(ESSE TEXTO NÃO PODE SER COPIADO SEM OS DEVIDOS CRÉDITOS DE AUTORIA, CONFORME A LEGISLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS LEI 9610, de 19 de fevereiro de 1998, "Dos Direitos Morais do Autor", Artigo 24, Inciso II. POR FAVOR, NÃO COPIEM, COMPARTILHEM O LINK. OBRIGADA)
Referências bibliográficas:
MÉDICI, Ademir: Migração e Urbanização: Presença de
São Caetano do Sul na região do ABC, Editora Hucitec, São Caetano do Sul, 1993.
* É
jornalista, pesquisadora, historiadora. Formada em jornalismo pela Universidade
Metodista, com formação em ciências sociais pela USP e Direito pelo Mackenzie,
tem especialização em Fundamentos e Artes pelo Instituto de Artes da UNESP de
São Paulo e Mestre em história pela PUC de São Paulo. É autora do livro Abre as
portas para os Santos Reis da Editora Fundação Pró-Memória, Animais nas
Batalhas pela editora Matrix e Os benzedores que benzem com as mãos da editora
UCG.
Para ver mais posts sobre São Caetano do Sul: http://promemoriasaocaetano.blogspot.com.br/
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