segunda-feira, 11 de abril de 2016

Crônicas do cotidiano
O churrasco, pesadelo e a entrevista que não aconteceu
Por: Priscila Gorzoni




Hoje quando eu ia para uma entrevista na Vila Gerti passei na frente de uma casa em que estive há muitos anos para fazer uma outra entrevista.

Olhei para a casa e dei risada, porque a história que envolve essa casa é engraçada, pelo menos para mim.

Isso faz muito anos, mais de 10 anos e eu fazia um trabalho sobre a Folia de Reis em São Caetano do Sul.

Na verdade e entrevista seria para o meu livro Abre as portas para os Santos Reis, que foi publicado em 2007.

Eu havia combinado de ir a essa casa onde eles fariam um almoço para receber o grupo de folia de reis.

Era um domingo muito quente e sinceramente eu preferia ficar em casa, almoçar com a minha família e ficar na calma.

Mas precisava ir para fechar as entrevistas do livro.

Então peguei o gravador e a máquina fotográfica e fui.

Quando fui chegando na casa já tinha um monte de gente, na verdade era uma multidão que não cabia dentro da casa, então tinha muita gente na rua.

Isso me assustou inicialmente porque não gosto de multidões e de locais muito cheios. Mas não tem como, onde tem folia de reis tem multidões e muitas pessoas. Faz parte.

Desci do carro e fui até a casa que já no portão estava tomada de fumaça, era um fumaceiro do churrasco que eles faziam lá dentro. 

Bom, churrasco é o tipo de programa que abomino, simplesmente porque sou vegetariana e não posso nem com o cheiro de carne que me dá enjoo. Pessoas que gostam de animais não deveriam ser carnívoras, pois é uma questão de coerência. Comer carne é comer animais mortos. O mundo deveria ser vegetariano. Só de ver carne já penso que é um cadáver de animal, algum animal sofreu.

E o pior é a combinação churrasco, multidão, pagode, samba, sertanejo, axé, forro e funk e cerveja, abomino, para mim é pior do que A Noite dos Zumbis. Não bebo, sou natureba, tenho os hábitos bem saudáveis não por motivos religiosos (não tenho religião), mas por respeito aos animais, porque não gosto de carne mesmo, gosto do budismo. Não quero viver muito enfim, não bebo simplesmente porque não gosto do sabor, não gosto nem do cheiro de cerveja e nem de destilado e também não gosto de ambientes com bêbados e de gente chapada. Não tenho paciência, abomino esse público. 

A combinação samba, pagode, axé, funk, sertanejo, forro, multidão, churrasco, cerveja/pinga/destilado e gente bêbada ou chapada para mim é bombástica, tipo abominável, pior do que passar uma noite com os Zumbis, prefiro os Zumbis disparado. Sou sincera, é a realidade.

Sou enjoada, sim, sei que sou.

Mas enfim estava eu ali na porta da casa com aquele fumaceiro de churrasco, cheiro de carne e de cerveja, nem queria entrar, sinceramente. Tudo me convidava a fugir, voltar para o sossego da minha casa. Mas o trabalho me obrigava a ficar.

Entrei e procurei o dono da festa, o dono da casa, aquele que receberia o grupo de folia de reis. 

Para completar o dono da casa um homem bem falante já meio chapado, cheirando a cerveja e churrasco veio me receber e falava enrolado. Imaginei como poderia entrevistar alguém nessas condições, não daria mesmo.

Perguntei se ele era o dono da casa, ele que já estava com os olhos vermelhos e a voz pastosa demorou para responder. Por fim disse que era. 

Ele estava tão ´pra lá de marrakech`que me perguntou se eu era do grupo de folia de reis. Inclusive eu perguntava quando o grupo chegaria e ele me devolvia a pergunta. A confusão dele era tanta que nem sabia quem fazia parte do grupo de folia de reis.

Enquanto eu falava com ele na porta da casa o fumaceiro só aumentou, começou a subir e eu fiquei preocupada da casa pegar fogo também. E aquela falação, aquele pessoal falando alto, aquele homem com cheiro de cerveja, nem a Noite dos Zumbis seria para mim mais assustadora.

Respeito o gosto das pessoas, suas formas de viverem, mas tenho que ser sincera para mim não dá.

E percebi que não daria para eu trabalhar também, o ambiente não estava receptivo a isso. Como entrevistar pessoas ´chapadas`, não dá né.

Foi então que eu disse para ele que iria no carro pegar um negócio que eu havia me esquecido lá e voltaria.

Fui, peguei o carro e não voltei mais.

Terminei o trabalho, compreendo o gosto e hábitos das pessoas, mas não dá para forçar o meu.

E hoje passando na frente da casa me lembrei essa história e dei risada.


(ESSE TEXTO NÃO PODE SER COPIADO SEM OS DEVIDOS CRÉDITOS DE AUTORIA, CONFORME A LEGISLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS LEI 9610, de 19 de fevereiro de 1998, "Dos Direitos Morais do Autor", Artigo 24, Inciso II. POR FAVOR, NÃO COPIEM, COMPARTILHEM O LINK. OBRIGADA)  


Fonte: O livro das curiosidades de São Caetano do Sul, Priscila Gorzoni

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