Crônicas Das benzedeiras
Mal
o sol apareceu e eu segui até a casa de Sílvia R, 62 anos,
benzedeira há 20 anos. Depois de tantas subidas e descidas a seguir o rumo dos
trilhos dos trens que vão para Rio Grande da Serra enfim alcanço a casa de
Sílvia. Ela fica bem na entrada da cidade, no alto sentimos o ar puro do verde
da região. Lá está ela no topo da escada de sua casa esperando.
-Foi
fácil encontrar o endereço?
Explico
um pouco cansada de dirigir que não foi tão fácil, mas deu tudo certo então
poderíamos iniciar a entrevista. Ao subir a escada Sílvia vai explicando porque
resolveu morar ali e como surgiu o benzimento em sua vida.
-Sempre morei afastada dos centros e naquela
época não haviam tantos postos de saúde. Para socorrer os meus filhos comecei a
benzer. Mas o aprendizado foi puramente intuitivo, ninguém me ensinou.
No
inicio Dona Sílvia ministrava os chás de seu quintal para as crianças com
dores, depois ela percebeu que a eficácia dependia de algo a mais: a reza e a
fé. Ao chegar na sala percebi muitas esculturas e quadros esotéricos. Mas ela
continuou contando sua vida e me conduziu até um dos sofás. Vi logo que não
terei dificuldades de entrevista-la. Escolhi uma das pontas do sofá, um lugar
onde eu pudesse ficar de frente para a benzedeira e absorver seus traços e
expressões para as fotos. Nisso ela continuou contando toda a sua trajetória,
pausando apenas para respirar.
-Eu
dava o chá e pedia pelo meu anjo da guarda, rezando o Pai Nosso e a Ave Maria.
Não dava nem uma hora e a criança já estava bem. Não queria que a fama corresse
pela vizinhança, mas não teve jeito com o tempo a noticia se espalhou e além de
seus filhos, apareciam outras crianças com problemas.
Enquanto
ia falando Sílvia se arrumava entre as almofadas simples o sofá. Abre a janela
para entrar um pouco de vento, mas é inútil, embora more em um lugar alto o sol
da 13 desce quente, sufocante deixando minha mãe com mais dor de cabeça ainda.
Aproveito e peço para Sílvia benzer minha mãe quem sabe não passe a enxaqueca.
Ela de imediato pergunta:
-Você
quer que eu a benza?
Minha
mãe de pronto aceita. Então Sílvia pede que ela fique em pé diante dela e deixe
o corpo solto, inclusive as mãos. Pega uma pequena adaga toda trabalhada e
passa sobre a fronte de minha mãe emitindo uma reza baixa. Continua a reza
durante algum tempo.
-Agora
vire-se de costas.
Minha
mãe se vira e então Sílvia continua a reza. Ao final pega o pentagrama e o
cordão mágico, um longo colar de 100 contas coloridas, coloca sob seu pescoço e
novamente reza baixinho. Ao final ela explica:
-Uso
faca, adaga e o punhal para cortar as más energias que afetam a pessoa. São
elas que trazem as doenças. Antes é preciso fazer uma limpeza energética e
depois o benzimento para determinado problema.
Acostumada
a lidar com os males da alma e do corpo só de olhar Sílvia já sabe o que a
pessoa tem, por isso levanta-se do sofá onde já finalizou a sua purificação
também e corre para o quintal pedindo a nossa companhia.
-Só
rezas não são suficientes é preciso trabalhar com as ervas também. E elas são
escolhidas dependendo da doença. De olhar numa pessoa já sei se ela está com
energia negativa. Isso é o que trás os outros males.
Mesmo
falando ela continua agachada no quintal procurando alguns alecrins para lhe
fazer um escalda-pés. De posse deles dentro de uma bacia, ela prepara água
quente e explica:
-Afinal
ninguém é de ferro.
(ESSE TEXTO NÃO PODE SER COPIADO SEM OS DEVIDOS CRÉDITOS DE AUTORIA, CONFORME A LEGISLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS LEI 9610, de 19 de fevereiro de 1998, "Dos Direitos Morais do Autor", Artigo 24, Inciso II. POR FAVOR, NÃO COPIEM, COMPARTILHEM O LINK. OBRIGADA)
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