terça-feira, 3 de maio de 2016

Crônicas Das benzedeiras 
Por: Priscila Gorzoni




Mal o sol apareceu e eu segui até a casa de Sílvia R, 62 anos, benzedeira há 20 anos. Depois de tantas subidas e descidas a seguir o rumo dos trilhos dos trens que vão para Rio Grande da Serra enfim alcanço a casa de Sílvia. Ela fica bem na entrada da cidade, no alto sentimos o ar puro do verde da região. Lá está ela no topo da escada de sua casa esperando.

-Foi fácil encontrar o endereço?

Explico um pouco cansada de dirigir que não foi tão fácil, mas deu tudo certo então poderíamos iniciar a entrevista. Ao subir a escada Sílvia vai explicando porque resolveu morar ali e como surgiu o benzimento em sua vida.

 -Sempre morei afastada dos centros e naquela época não haviam tantos postos de saúde. Para socorrer os meus filhos comecei a benzer. Mas o aprendizado foi puramente intuitivo, ninguém me ensinou.

No inicio Dona Sílvia ministrava os chás de seu quintal para as crianças com dores, depois ela percebeu que a eficácia dependia de algo a mais: a reza e a fé. Ao chegar na sala percebi muitas esculturas e quadros esotéricos. Mas ela continuou contando sua vida e me conduziu até um dos sofás. Vi logo que não terei dificuldades de entrevista-la. Escolhi uma das pontas do sofá, um lugar onde eu pudesse ficar de frente para a benzedeira e absorver seus traços e expressões para as fotos. Nisso ela continuou contando toda a sua trajetória, pausando apenas para respirar.

-Eu dava o chá e pedia pelo meu anjo da guarda, rezando o Pai Nosso e a Ave Maria. Não dava nem uma hora e a criança já estava bem. Não queria que a fama corresse pela vizinhança, mas não teve jeito com o tempo a noticia se espalhou e além de seus filhos, apareciam outras crianças com problemas.

Enquanto ia falando Sílvia se arrumava entre as almofadas simples o sofá. Abre a janela para entrar um pouco de vento, mas é inútil, embora more em um lugar alto o sol da 13 desce quente, sufocante deixando minha mãe com mais dor de cabeça ainda. Aproveito e peço para Sílvia benzer minha mãe quem sabe não passe a enxaqueca. Ela de imediato pergunta:

-Você quer que eu a benza?

Minha mãe de pronto aceita. Então Sílvia pede que ela fique em pé diante dela e deixe o corpo solto, inclusive as mãos. Pega uma pequena adaga toda trabalhada e passa sobre a fronte de minha mãe emitindo uma reza baixa. Continua a reza durante algum tempo.
-Agora vire-se de costas.

Minha mãe se vira e então Sílvia continua a reza. Ao final pega o pentagrama e o cordão mágico, um longo colar de 100 contas coloridas, coloca sob seu pescoço e novamente reza baixinho. Ao final ela explica:

-Uso faca, adaga e o punhal para cortar as más energias que afetam a pessoa. São elas que trazem as doenças. Antes é preciso fazer uma limpeza energética e depois o benzimento para determinado problema.

Acostumada a lidar com os males da alma e do corpo só de olhar Sílvia já sabe o que a pessoa tem, por isso levanta-se do sofá onde já finalizou a sua purificação também e corre para o quintal pedindo a nossa companhia.

-Só rezas não são suficientes é preciso trabalhar com as ervas também. E elas são escolhidas dependendo da doença. De olhar numa pessoa já sei se ela está com energia negativa. Isso é o que trás os outros males.

Mesmo falando ela continua agachada no quintal procurando alguns alecrins para lhe fazer um escalda-pés. De posse deles dentro de uma bacia, ela prepara água quente e explica:

-Afinal ninguém é de ferro.



(ESSE TEXTO NÃO PODE SER COPIADO SEM OS DEVIDOS CRÉDITOS DE AUTORIA, CONFORME A LEGISLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS LEI 9610, de 19 de fevereiro de 1998, "Dos Direitos Morais do Autor", Artigo 24, Inciso II. POR FAVOR, NÃO COPIEM, COMPARTILHEM O LINK. OBRIGADA)  




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